NOTA PÚBLICA DA AMATRA-2 EM REPÚDIO ÀS DECLARAÇÕES DE JAIR BOLSONARO ACERCA DO TRABALHO INFANTIL

A AMATRA-2 vem a público repudiar as afirmações do Sr. Presidente da República, Jair Bolsonaro, que disse não haver prejuízo na existência do trabalho infantil no Brasil.

A ciência, a medicina, o direito e a história dizem exatamente o contrário. A criança é um organismo em formação, e sua submissão a esforços para os quais não esteja preparada pode acarretar danos jamais sanáveis. Não por acaso, no quesito de acidentes do trabalho com crianças, especialmente de 05 a 17 anos, o Brasil, assim como ocorre em outros indicadores macabros, é um dos campeões mundiais, com mais de 43 mil casos registrados entre 2007 e 2017, segundo o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) do Ministério da Saúde. Dados do PNAD indicam que há, no país, mais de 2,7 milhões de crianças trabalhando, o que equivale a mais da metade da população da Irlanda, por exemplo.

O Brasil, no pacto social que culminou com a elaboração da Constituição Federal de 1988, decidiu que a criança merece proteção integral, e fez constar em seu artigo 227 que é dever de todos que compõem o seio social , mas especialmente do Estado, promover à criança, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-la a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. No mesmo sentido, as inúmeras normas internacionais das quais o Estado brasileiro é signatário.

Não se concebe, assim, que o chefe do Estado venha a público e faça afirmação totalmente em desacordo com a Constituição à qual ele próprio jurou proteger quando assumiu o cargo de Presidente da República.

O trabalho infantil é, das chagas sociais existentes, a de pior efeito, pois inibe que o ser humano possa se desenvolver por completo, tenha educação condigna e consiga tornar-se um adulto com as condições de viver de acordo com seus próprios anseios.

Não se pode admitir, ainda, que o contraponto ao trabalho infantil seja o uso de “paralelepípedo de crack”, fazendo crer que, não estando no trabalho, a criança necessariamente estaria consumindo drogas ilícitas. Caso tenha acesso a políticas públicas consistentes de responsabilidade do Estado, isso não ocorrerá. Aliás, é sempre bom lembrar que no Brasil as estatísticas mais conservadoras dão conta da existência de 13,2 milhões de adultos em situação desemprego, o que demonstra que os postos de trabalho irregularmente ocupados por crianças deveriam ser destinados aos adultos e, não, a seres em formação.

Por todos esses motivos, a AMATRA-2 repudia veementemente as inaceitáveis declarações do Presidente da República, de quem se exige, ao invés de atitudes que fomentem o retrocesso social, o cumprimento da sua função constitucional, de efetivação das medidas de proteção à criança.

Diretoria da AMATRA-2 (Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região)

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